22.6.07

trabalho decente

afinal acho que sim, também tenho um motto enquanto professora: nunca deixar de mostrar que para além do que se ensina fica sempre uma imensa vastidão por ensinar

21.6.07

um, dois, três...cinquenta e três!

dirijo-me à senhora de cabelos esbranquiçados que vem a descer as escadas e pergunto-lhe se por acaso sabe em que andar fica a sala nº 342. ela responde delicadamente que não porque não anda de elevador; mas acrescenta, solícita, que se eu subir as escadas contando os degraus, posso ter a certeza que ao 53º estou no patamar do corredor onde fica a sala para onde quero ir. agradeço e começo a subir contando e rindo.

food for thought

esta é hoje a minha questão teórica: é mais fácil transformar um amigo num amante ou um amante num amigo? ao contrário também funciona: é mais difícil transformar um amigo num amante ou um amante num amigo?

o nome e a coisa

andava maçada com o título deste blog. ontem, enquanto ouvia o mgd e o mv, durante o lançamento do livro do último, percebi que o que eu fazia aqui era, exactamente, "caressing trivia". concordo com o mgd que 'acariciar' não soa bem em português, nem 'afagar', que remete para o afagamento do chão. quanto ao trivia, o problema é maior: como chamar a um livro 'acariciando o ordinário'? como a questão é central na obra/vida do mv, não é a primeira vez que a questão se lhes coloca. e assim recordaram o título do seu livro comum anterior e anterior 'a glória do vulgar'. quase saltei na cadeira de espanto - como é que me pude esquecer, eu que há anos tomei essa frase como motto da minha vida, que ela seria o nome 'natural' desta escrita?

20.6.07

lisboetas e sinização

peço desculpa aos lisboetas pela acusação que lhes fiz de desfazerem a cidade não percorrendo a pé as suas ruas nem circulando ou estacionando o corpo nas suas praças. isto é, de não fazerem (uma) cidade. a verdade é que hoje (vi)vi, com outros lisboetas, a cidade. depois de ouvir, na telefonia, o anúncio da instalação, no jardim da estrela, de uns "equipamentos urbanos" para as pessoas mais velhas fazerem movimentos de variada ordem, apressei-me a ir experimentá-los. qual não foi o meu espanto quando encontro, em roda de todos eles (não, não é um local colorido e demarcado, qual parque infantil, como em pequim, mas umas máquinas de ar sisudo e cinzento espalhadas pelo jardim inteiro) diferentes grupos de pessoas. como, julgo que para animar o evento, a aula de ginástica da junta de freguesia foi hoje feita no jardim, havia também muitos velhos, e alguns novos, a fazer os mais variados exercícios. entre os quais anotei, boqueaberta, uma mulher a andar para trás. se isto não é a globalização a fazer-se, também, de lá para cá, não sei o que é. i mean, uma senhora portuguesa a andar para trás não é apenas uma senhora a andar para trás. é também uma cultura (?)/sociedade (?)/ tradição (?) a andar para a frente...

o cheio e o vazio

ao adormecer é a tortura de não poder esvaziar a cabeça de tudo que quero fazer/escrever no dia seguinte (que até sábado assentava no tm, já na cama, às escuras). ao acordar é o suplício de não saber como encher a cabeça com tudo o que tenho para fazer/escrever durante o dia (que até domingo ia buscar ao tm, já na cozinha, cheia de luz e de cheiro a café). não perdi um tm, perdi uma agenda, um tranquilizante e um estimulante. não perdi uma agenda, uma agenda, um tranquilizante e um estimulante, perdi todo um modo de vida. não perdi todo um modo de vida, perdi a própria vida no que ela tem de ritmada alternância entre os movimentos, opostos mas complementares, de expansão e contracção.

19.6.07

sopros de riscos

no seguimento da lição de jubilação do hdr., cujo título foi «pensamento e acção do humano sistémico», além de ter descoberto noções verdadeiramente inesperadas para mim, como por exemplo, a de 'engenharia sistémica', percebi que subjacente à engenharia havia (também) uma poesia. repare-se apenas no título de um dos muitos artigos do jubilado "sopros de riscos: teoria e prática do controlo de fumo em incêndios nos edifícios".

18.6.07

vive la repúblique

gosto mais das histórias de (des)amor republicanas do que das histórias de amor reais. além de serem mais intensas (que rainha anunciaria ter posto o marido fora de casa?), permitem-nos acreditar que nos interessamos por elas pelas suas implicações políticas...

less is more

sem automóvel nem telemóvel sinto-me leve e despreocupada. dito de outra maneira, sem automóvel nem telemóvel, fiquei bastante menos imóvel.

a cama dela

o post a que dei o título "a minha cama", por nele publicar a fotografia de uma instalação da tracey emin (este ano a representar o ru, na bienal de veneza), chamada "my bed" e destinada a ilustrar o estado do mundo à minha volta depois de vários dias de cama, com uma forte gripe, deu origem a desentendimentos familiares. isto porque a imagem foi tomada por alguns parentes como sendo uma fotografia tirada por mim à minha própria cama, por fazer e num quarto de dormir em mess total. não páro de receber sms a perguntar se já fiz a cama e e-mails a aconselhar mais reserva na exposição da minha vida íntima. nem quero imaginar o que teria sido a reacção se por acaso a imagem fosse maior deixando visíveis os adereços mais íntimos da parafrenália, montada em volta da cama (DELA) e que tanto escândalo provocaram no ru aquando da primeira exposição da obra.

estado do mundo

visto pelos olhares de

vicente ferraz (brasil)







ayisha abraham (índia)







chantal akerman (bélgica)



apichatpong weerasethakul (tailândia)










pedro costa (portugal)











wang bing (china)

gilgamesh

assistir a esta peça de teatro, baseada na mais antiga epopeia do mundo, gilgamesh, poema oriundo do que hoje é o iraque, escrita, encenada e representada por uma companhia oriunda do que hoje é a palestina, dá hoje, sábado, 16 de junho, muito que pensar. esse parece ser, de resto, um dos objectivos do espectáculo já que a encenação dos heróicos combates - do confronto inicial entre gilgamesh e enkidou à luta posterior que ambos levam a cabo contra a guardiã da floresta, pela posse da madeira preciosa - nos é re(a)presentada a partir da tensão entre a impossibilidade (a ocupação e a guerra impedem o teatro) e o desejo (a resistência nacional torna o teatro possível) da re(a)presentação

17.6.07

júbilo

dou hoje por encerradas as buscas ao meu telemóvel desaparecido no sábado à noite na rua nicolau bettencourt, em lisboa. durante toda a noite ele foi sempre respondendo às minhas sucessivas chamadas mas hoje de manhã, ou porque sem forças próprias ou obrigado por forças alheias, já não deu sinal de si. fiz tudo o que a minha imaginação me permitiu - desde ligar para casa de todos os "domingos barros" (nome do motorista de táxi que ontem me trouxe do mundo gilgamesh para casa) residentes no distrito de lisboa, passando pela busca do mesmo d.b. em todas as companhias de taxi locais até à inquirição, na gulbenkian, dos seguranças de todas as portas, de todos os jovens que trabalham no 'estado do mundo', de todos os funcionários de todas as bilheteiras. o que não quer dizer que tenha perdido a esperança. ainda há pouco, seguindo um impulso inesperado, saí de casa e fui espreitar na caixa do correio. e sei que amanhã, a caminho do trabalho, vou fantasiar que ele lá está à minha espera. o sr. domingos barros rendeu logo a seguir a ter-me deixado em casa por isso não ouviu o tm que passou a noite caido no banco de trás. esta manhã, encontrando-o desligado não conseguiu ver nem ouvir as minhas mensagens. sendo domingo não trabalhou por isso não o devolveu à companhia para onde trabalha nem esta foi capaz de o contactar. amanhã, segunda-feira, o sr. domingos barros, a quem eu ensinei a dizer 'café' em chinês, vai perceber que, entre todos os passageiros que transportou no sábado, a verdadeira passageira sou eu. e vai-me telefonar, do meu próprio telemóvel, a combinar um encontro. como vou à caparica, à aula de jubilação do hdr, ao fim do dia, até lhe posso pedir para me levar. é o contrário de um embrulho, ele vai ficar contente. só pode de resto ser com o sr. domingos barros pois fico sem maneira de contactar o sr bodhan às 5 horas, conforme combinado para ele me levar à un, do outro lado. ir com o sr. bodhan era divertido porque sempre aprendia mais um pouco de russo. paciência, a viagem com o sr. domingos barros também inclui uma parte de linguística - ele vai pedir-me para lhe ensinar mais palavras chinesas. vou ensinar-lhe como se diz telemóvel, telefonar, e até, talvez, como se atende o telefone em chinês, wei! shei a?

da praça de espanha à estrela

lisboa é por certo a única capital 'nacional', no mundo inteiro, na qual um nativo pode percorrer, durante 35 minutos, três das principais avenidas do centro da cidade e duas das suas praças mais centrais, num fim de tarde de domingo, sem chuva nem vento, o tempo nem quente nem frio (isto é, perfeito), cruzando-se com menos de uma dúzia de outros nativos: uma senhora, acabada de sair de um taxi, que metia a chave na porta de casa, e uma família de 3 membros a descarregar o que parecia ser bagagem de fim de semana, da mala de um automóvel para uma entrada de serviço, na antónio augusto de aguiar; um casal a passear um cão, na fontes pereira de melo; 3 adolescentes, na rua brancaamp; e dois senhores na álvares cabral, um, concentrado a varrer o seu bocado de passeio e outro, de aspecto desvairado, a descer o passeio numa velha bicicleta. o número de esplanadas, restaurantes, cafés, pastelarias, tascas, casas de pasto, cafetarias, tabernas ou bares, abertos, ao longo do percurso, era proporcional ao número dos transeuntes nativos: além do mcdonalds da rodrigo sampaio e da pizza hut da alvares cabral, apenas uma heróica pastelaria, a "estrela de ouro", tinha a porta entreaberta (já que o dono varria o seu bocadinho de passeio). não fosse a presença, um pouco por todo o percurso, dos novos lisboetas, oriundos de muitas e variadas partes do mundo, e, mais concentradamente, em volta do marquês, dos turistas, sobretudo espanhóis, e eu não voltaria a atrever-me a sair de casa a um domingo.
PS. não se trata, como fica claro, da baixa, a única zona da de lisboa oficialmente reconhecida como desertificada, mas de uma importante parte da alta, infelizmente representativa de toda a paisagem urbana da cidade. embora admita vir a mudar de opinião, hoje não tenho qualquer dúvida de que o problema fundamental de lisboa são os lisboetas.